O QUE PODE ADVIR,
NA PRÁTICA, DA DECISÃO DO STF
CONTRA A PRESUNÇÃO
DE INOCÊNCIA
Roberto Parentoni
Recentemente o Supremo Tribunal
Federal decidiu, no julgamento de Habeas Corpus, decretar a legalidade da
prisão de um acusado logo após decisão de segunda instância, contrariando o
artigo 5º, LVII, que diz que ninguém será julgado culpado até trânsito em
julgado de sentença penal condenatória.
De acordo com a Constituição Federal,
ninguém poderá ser considerado culpado até que não haja mais possibilidade de
recurso, e exista, então, uma sentença condenatória de última instância, ou
seja, de terceira instância, o que chamamos de “transitada em julgado”. Com
essa decisão, a garantia constitucional de que você é inocente até que se prove
a sua culpa deixou de imperar. Agora, você é considerado culpado até que prove
o contrário, ou seja, sua inocência.
Se o STF, ao invés
de interpretar a CF, a modifica, especialmente uma cláusula pétrea, podemos
entender que, das duas uma: ou a CF não serve mais às demandas de nosso País ou
a democracia está em perigo. No primeiro caso, democraticamente, o
caminho seria a mudança da CF por seus meios legais, mas no segundo caso,
estamos entrando em um Estado totalitário.
Ainda que devesse,
entendo que a população em geral não compreenda o significado desta decisão
histórica do STF, mas operadores do Direito sendo protagonistas e fãs
declarados dessa aberração jurídica, é preocupante. Muitos operadores do
Direito, e também os leigos, chamam a possibilidade de recursos como “brecha na
lei”. E muitos outros os classificam como “protelatórios”. Eu digo que cada
ponto de vista é apenas a vista de um ponto.
Vejo pelo ponto de
vista que de que a Constituição foi alterada por um poder que não tem
legitimidade para fazê-lo. Qual outro ponto de vista, nesse caso, nos dará
segurança jurídica, política ou social, não sendo este, o do respeito à
Constituição do nosso país? Os defensores da Constituição não se conformarão
com essa decisão. Já temos colegas que apresentaram recurso à Corte
Interamericana de Direitos Humanos e de proposição de medidas para anular essa
decisão.
Dois outros grandes
problemas serão a super hiper-lotação das cadeias e os que forem absolvidos
posteriormente, ou seja, tiverem sido presos ilegalmente e passado períodos
nefastos na prisão. Irá o STF decidir pelo pagamento de indenização já na
primeira instância? Vejo ainda que tal decisão não impacta apenas a área
criminal, tampouco apenas os casos de homicídio ou de colarinho branco. Todos
os casos em que o povo chora, como o da pobre alma que furtou um pão por fome,
cairá na mesma situação.
Vale lembrar que em todas as áreas do
Direito é pertinente que as partes recorram até a terceira instância. Advogados
de outras áreas que não a criminal poderão, quem sabe, impactar o Judiciário,
reivindicando o cumprimento de sentenças favoráveis aos seus clientes,
especialmente do INSS, precatórios e indenizações contra o Estado, entre
outras, já na segunda instância, uma vez que a terceira instância parece ter se
tornado obsoleta para o STF.
O Estado
(Municípios, Estados e a União) é o maior cliente do Judiciário, em sua maioria
como requerido/réu. Será que veremos, por analogia, o STF legislando a favor do
povo nesses casos? Para que esperar até a terceira instância? Que digam todas
as pessoas que têm ação tramitando contra o Estado (INSS, indenizações,
precatórios, etc.), que esperam infinitamente por uma sentença do Judiciário
que, na sua grande maioria, trata-se de Direito líquido e certo. Ou
continuaremos a ouvir: “meu neto ou bisneto talvez consiga receber o que tenho
direito”?
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*Roberto Parentoni é advogado
criminalista e presidente do Ibradd - Instituto Brasileiro do Direito de
Defesa.
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