Secretário de Administração Penitenciária de São Paulo em 2008, Antonio Ferreira Pinto, hoje titular da Secretaria Segurança Pública, admitiu a funcionários do Consulado dos Estados Unidos que as cadeias do Estado eram tão ruins que se pareciam com "campos de concentração". A revelação sobre a precariedade do sistema prisional paulista foi feita em fevereiro daquele ano e consta de um dos 2,5 mil telegramas oficiais da diplomacia americana referentes ao Brasil, obtidos pelo WikiLeaks, que a agência A Pública divulga durante essa semana.
A declaração do ex-oficial da Polícia Militar Antonio Ferreira Pinto provocou perplexidade, conforme comunicado enviado a Washington. "As autoridades estaduais nos impressionaram com sua franqueza em admitir falhas severas no sistema prisional".
A conversa com o então secretário de Administração Penitenciária deixou os representantes diplomáticos dos Estados Unidos convictos de que São Paulo não contava "com políticas públicas para combater os problemas prisionais". Deixou claro ainda que mazelas do sistema prisional do Estado, como a superlotação, permaneciam sem solução à vista e que não havia "iniciativas para reabilitação de ex-detentos e de programas para transformar possíveis criminosos em membros produtivos da sociedade".
Rede "quebrada e desorganizada"
Segundo informações divulgadas por A Pública, Antonio Ferreira Pinto afirmou aos diplomatas que assumiu uma rede "quebrada e desorganizada", após a saída de seu antecessor, Nagashi Furukawa, que permaneceu à frente da secretaria por sete anos consecutivos, entre 1999 e 2006 - até os ataques e rebeliões orquestradas pelo Primeiro Comando da Capital (PCC), em maio daquele ano.
Ferreira Pinto relatou também aos diplomatas americanos suas críticas quanto à construção de presídios em zonas empobrecidas do Estado como forma de estimulá-las economicamente, um dos principais projetos em segurança pública da primeira gestão do governador Geraldo Alckmin (2001-2006).
Com base nas informações de Ferreira Pinto, os diplomatas atestaram que "a consequência involuntária desse plano foi que as prisões passaram a funcionar longe das famílias dos encarcerados" e que "além dos presídios mal localizados, o Estado também não conta com número suficiente de instalações para regime semi-aberto ou centros de reabilitação que poderiam ser úteis para enfrentar a reincidência".
Corrupção
De acordo com A Pública, Antonio Ferreira Pinto afirmou aos funcionários do Consulado americano que, no sistema penitenciário paulista, a corrupção estava por todos os lados. "É comum que os funcionários dos presídios atuem de maneira ilegal, admitiu o secretário, e sublinhou que algumas penitenciárias são como "casas" para criminosos que deixam as instalações durante o dia e regressam apenas à noite, para dormir", dizia o telegrama.
Referindo-se à superlotação das cadeias, Ferreira Pinto afirmou que, logo depois de assumir, foi obrigado a fechar algumas penitenciárias porque, "mesmo para os padrões brasileiros", suas "condições sub-humanas" eram inaceitáveis. Mas o então secretário de Administração Penitenciária lembrou aos diplomatas americanos que oito novas penitenciárias foram construídas pelo o governador José Serra (2006-2010) apenas em 2008, nas regiões mais populosas do Estado. Até hoje, apenas quatro presídios saíram do papel.
Ferreira Pinto destacou que o Estado possuía sérias restrições orçamentárias em fevereiro de 2008, o que dificultava a solução do problema penitenciário em São Paulo. Segundo a agência A Pública, porém, o senador Aloysio Nunes Ferreira, na época titular da Casa Civil paulista, afirmou, também ao Consulado dos Estados Unidos, que dinheiro não seria problema.
"Nunes observou que tanto o orçamento como o crédito de São Paulo estão em boa forma e alguns recursos oriundos da privatização de inúmeras rodovias estaduais e da Companhia Energética de São Paulo (CESP) podem ser dirigidos para melhorar as prisões", relatava o telegrama.
Entre 2006 e 2009, durante a gestão de Antonio Ferreira Pinto, a Secretaria de Administração Penitenciária gozava de um dos maiores orçamentos do Estado. Havia, e segue havendo, mais dinheiro para o sistema prisional do que para Saúde, Agricultura e Cultura, por exemplo. Em 2006, a SAP recebeu R$ 1,324 bilhão, cifra que foi crescendo até atingir R$ 2,422 bilhões em 2009, quando Ferreira Pinto deixou a pasta. Atualmente, a Secretaria que cuida dos presídios paulistas conta com uma receita anual de R$ 2,714 bilhões, informa A Pública, que procurou Antonio Ferreira Pinto.
Por meio de sua assessoria de imprensa, ele negou que tenha feito as afirmações reveladas pelo documento. "O secretário não irá comentar as declarações porque sequer lembra de haver se encontrado com estas pessoas".
Também por meio de sua assessoria, Aloysio Nunes Ferreira comunicou que não iria comentar os assuntos relacionados ao WikiLeaks.
Fonte: Terra
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